segunda-feira, setembro 11, 2006

NAS PASSADAS DE HITCHCOCK I - Os psicopatas





O que é que aconteceu ao suspense hitchcockiano? Morreu com o cineasta ou ainda existe no cinema dos nossos dias? Na verdade bem sabemos que o suspense não é uma criação de Hitchcock e que já o encontrávamos bem evidente na literatura de Edgar Allan Poe e de H. G. Wells ou no cinema de D. W. Griffith e de Fritz Lang.

Grifith compôs belas sequências de suspense em “Nascimento de Uma Nação” (1915) e em “Intolerância”(1916). Lang foi o criador de brilhantes filmes de suspense como “M” (1931), “The Woman in the Window” (1944) e “O Segredo da Porta Fechada” (1947).

O suspense conhece muitos matizes. Na vida humana como em qualquer forma de arte. O suspense hitchcockiano segue alguns parâmetros e premeia certas temáticas. O que é que lhe sucedeu após o ano da morte de Hitchcock (1980)?

Parece-me evidente que nos últimos anos se operou uma diluição do suspense hitchcockiano em muitos estilos diferentes de thrillers e de histórias de mistério. Ao ponto de já não podermos argumentar com precisão se Hitchcock poderia ou não ter feito este ou aquele filme.

Hitchcock deixou uma legião de seguidores e eventualmente alguns sucessores. Ainda em vida, ele era já muito imitado e acabou competindo com aqueles que copiavam o seu estilo. Podemos neste contexto pensar em “Charada” (1963) e “Arabesco” (1966) de Stanley Donen, em “O Prémio” (1963) de Mark Robson ou em “Wait Until Dark” (1967) de Terence Young.

Brian De Palma que apresentou recentemente no Festival de Veneza o filme “A Dália Negra”, é um relevante continuador do suspense hitchcockiano. Os seus filmes de suspense têm sido financeiramente lucrativos especialmente aqueles que realizou nos anos 70 e 80. Exemplos: "Carrie" (1976), “Vestida para Matar” (1980) e “Testemunha de um Crime” (1984). Filmes mais espalhafatosos do que geniais e que eram exageradamente sangrentos. Com soluções visuais demasiado aparatosas e que evidenciavam algum mau gosto. Obras que aplicam um grande sensacionalismo visual e em que a música de Pino Donaggio procura adensar o suspense ao pormenor de cada segundo.

O primeiro filme hitchcockiano de Brian de Palma foi “Sisters” (1973) e logo depois seguiu-se-lhe “Obsessão”. Ambos têm música do compositor maior do cinema de Hitchcock: Bernard Herrmann.

“Obsessão” foi realizado com mais contenção e reenvia a memória do espectador para “Vertigo” (1958) com todo o seu espírito obsessivo, necrófilo e melancólico.

O que soa a mau gosto em De Palma, soa cruel mas intenso em Jonathan Demme. O seu “O Último Abraço” (1979) é fraco mas muito ao estilo de Hitchcock. O desenvolvimento final do seu “Selvagem e Perigosa” (1986) prende a respiração. A exploração competente do tema dos “serial killers” em “Silêncio dos Inocentes” (1991) revela uma enorme densidade emocional.

Em “Silêncio dos Inocentes” a direcção de actores é brilhante. E o impacto visual das imagens e do modo de filmar intensifica o desempenho dos actores. Alfred Hitchcock, realizador de “Frenzy” (1972), teria rodado um filme como este?

A área temática dos psicopatas é tão importante nos filmes de Hitchcock que lhe poderíamos dedicar um comentário extenso. Veja-se “O Inquilino Sinistro” (1926), “Mentira” (1943), “O Desconhecido do Norte-Expresso” (1952), “Frenzy” ou o incontornável “Psico” (1960).

Mas deve-se salientar que outros filmes historicamente relevantes contam histórias sobre psicopatas e são marginais ao cinema de Hitchcock. Como “Peeping Tom” (1960) de Michael Powell, “The Collector” (1965) de William Wyler ou “Repulsa” (1965) de Roman Polanski.

Nas últimas duas décadas têm-se feito muitos filmes em que o perigo decorrente da loucura se converte num suspense vertiginoso.

“Atracção Fatal” (1987) de Adrian Lyne e “Instinto Fatal” (1992) de Paul Verhoeven foram sucessos retumbantes. Ambos estão centrados num ambiente carregado de erotismo e em que a mulher-tentação se revela um perigo extremo. Glenn Close e Sharon Stone foram as brilhantes estrelas de cada um dos filmes.

Há outros tipos de psicopatas que têm assaltado as histórias dos filmes contemporâneos. O psicopata vingativo que procura repor implacavelmente uma justiça perdida. Exemplos: “A Mão Que Embala o Berço” (1992) de Curtis Hanson e “Jovem Procura Companheira” (1992) de Barbet Schroeder.

Psicopatas com traumas que sendo vítimas do seu destino se tornam carrascos do destino dos outros. Como Robin Williams em “One Hour Photo” e "Insónia" (ambos de 2002).

Histórias que até podem ser tristemente verídicas como acontece no caso do clássico “Massacre no Texas” (1974) de Tobe Hooper. (Aliás a história verídica desse psicopata havia inspirado "Psico" muitos anos antes.)

A loucura pode ser um fundamento credível para os procedimentos mais brutais. E parece conferir sentido e lógica a realidades inimagináveis. Hitchcock apercebeu-se disso. E do perigo que pode advir de um louco à solta. Perigo para os personagens. Emoção para os espectadores… Esta receita para o cinema de suspense não perdeu o seu impacto.

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