segunda-feira, agosto 22, 2005

AS ORIGENS DA MINHA CINEFILIA




Parece-me oportuno recordar aqui as origens da minha cinefilia. Sim. Para me conhecerem melhor, devem saber que sou um cinéfilo ferveroso. Falar de paixão pelo Cinema implica incontornavelmente , no meu caso, fazer referência a valores centrais. O nome de Alfred Hitchcock é um deles.
Conheci o cinema de Hitchcock há 20 anos. Numa simpática tarde de Maio de 1985, o meu pai convidou-me para o acompanhar a uma sala de cinema de Lisboa: o já encerrado e quase esquecido Apolo 70, perto da Avenida da República. Passava lá o filme "Janela Indiscreta". Lembro-me que gostei imenso daquele filme naquela sala pequena, acolhedora, quase familiar (foi uma das primeiras salas pequenas da capital e estava, como agora é comum, instalado num centro comercial).
Reparei que o papel das imagens naquela obra era de crucial importância e que era relevante ditar o que mostrar e de onde mostrar. Hitchcock comentou algures que o Cinema é, primeiro do que tudo, imagem. E verificamos que não é de estranhar que o princípio da sua filmografia se situe na década de 20 quando o cinema era mudo e a imagem precisava dizer tudo - ou praticamente tudo. De facto, a palavra em Hitchcock é sempre de menos relevante importância, as explicações nem sempre são tomadas como ponto de interesse central.

Voltando à minha experiência pessoal: Nesse Verão (1985), viria a decorrer no Cinema Quarteto um ciclo inteiramente dedicado a Hitchcock. Foi exibida a colecção de 5 películas às quais se intitulou "The Essential Hitchcock" e que eram obras que durante muitos anos não haviam sido exibidas. Os filmes em cartaz eram apresentados rotativamente, uma semana cada um. O ciclo prolongou-se durante muitas semanas e proporcionou ao público mais jovem um contacto interessante (para muitos, como eu, quase inédito) com o cinema de Hitchcock e com o espírito que emana dos seus filmes. Não eram raras as lotações esgotadas. Para quem possa não saber, os 5 filmes eram: "Janela Indiscreta" (1954), "Vertigo" (1958), "O Terceiro Tiro" (1955), "A Corda" (1948) e "O Homem que Sabia Demais" (1956).

No ano seguinte (1986), era eu um jovem estudante do Liceu. Tinha 16 anos, frequentava o 11º Ano num liceu da capital e nem sempre me encontrava satisfeito com a minha vida. As aulas durante a quinta-feira eram penosas porque no decurso da manhã inteira, estava ocupado com disciplinas da área financeira: a Economia, a Contabilidade e o inenarrável Cálculo Financeiro.
Descobri então esse paleativo para as minhas dores de alma... O Liceu ficava a 300 metros do Cinema Quarteto onde decorria um 2º ciclo de filmes do Hitchcock (de épocas variadas). Comecei a visitar assiduamente o local onde bebia um café, observava os cartazes do ciclo e via os trailers que passavam em monitores pequenos junto às bilheteiras. Respirava-se por ali um ambiente saudavelmente cinéfilo. Numa dada semana, dei comigo satisfeito. Já não andava tão atormentado.

Comecei a ler todos os artigos que se escreviam nos jornais sobre Hitchcock. Na televisão, nos últimos meses do ano, também exibiram muitos filmes dele na RTP2. Não resisti a comprar uma notável obra chamada "Hitchcock - Diálogo com Truffaut" que a Editora Dom Quixote oportunamente editou e vendeu com sucesso. E também um interessante mas pouco célebre ensaio em português: "O Cinema de Alfred Hitchcock" de Carlos Melo Ferreira (Editora Afrontamento).

Compreendi que filmes não acabam com as palavras FIM ou FIN ou THE END. Que a partir daí há imensos aspectos a descobrir num filme quando ele nos agrada ou sensibiliza. Converti-me num cinéfilo apaixonado. Já o era mas só então dei o facto como declarado.

Nos dias de hoje, não concebo a estruturação dos meus hábitos rotineiros sem o costume de ver filmes (na televisão, por exemplo) e de ler e escrever sobre eles. Devo confessar-vos amigos leitores: O Cinema tem-me ajudado a viver melhor. Funciona como um paleativo que atenua a dor e a amargura de certos momentos. Não resolve os problemas mas empresta cor e entusiasmo a certos dias cinzentos em que chove o dia inteiro e não temos ninguém por perto. Acho que o Cinema retrata a Vida mas também torna a Vida melhor...

Sem comentários: