quarta-feira, janeiro 03, 2007

APRESENTANDO A MÚSICA DE «CASA ENCANTADA»


O mais cómodo seria defender aqui que “Casa Encantada” é um filme prodigioso e sublime. Mas sempre considerei que há grandes Hitchcocks, Hitchcocks de menor importância e pequenos grandes Hitchcocks. “Spellbound” (1945) estará incluído nesta última categoria. Porque não sendo um filme genial, contém alguns aspectos de sobeja relevância.


O filme apresenta algumas cenas memoráveis como aquela em que os protagonistas se beijam e o êxtase da sua paixão é alegoricamente representado por uma sucessão de portas a abrirem-se. Gosto muito do desempenho da câmara neste filme. O modo como filma e a perspectiva em que se posiciona para nos mostrar aquele estranho mundo de sentimentos contraditórios. Como quando Ingrid Bergman sobe as escadas e fixa o olhar na porta do quarto de Gregory Pack. O «traveling» da câmara é soberbo.


Ingrid Bergman é simplesmente uma das actrizes mais carismáticas da História do Cinema. E o filme assenta-lhe nos ombros com segurança. O papel dela é forte e intenso e ela defende-o com paixão. Bergman foi a primeira grande actriz de Hitchcock. (Se não considerarmos Joan Fontaine que a passagem dos tempos confinou a algum esquecimento)


Hitchcock gostava intensamente de trabalhar com Bergman e os papéis que idealizava oferecer-lhe eram adequados e constituíam para ela verdadeiros desafios. Ingrid Bergman era tão igualmente soberba e convincente representando mulheres fortes e determinadas como figuras frágeis e inseguras.


Em “Casa Encantada”, Ingrid Bergman funciona como um dos trunfos centrais. Outra grande riqueza do filme é a música composta pelo inspirado Miklós Rózsa. É o trecho principal desta banda sonora, galardoada com um Óscar, que podemos escutar a partir desta semana no nosso blog.


É uma pequena homenagem a Miklós Rózsa. E ao talento intuitivo de Hitchcock que sempre reconheceu na Música um instrumento poderoso para veicular sentimentos e para os transpor directamente da tela para o coração dos espectadores.


Quanto a “Casa Encantada”, melhor seria se Hitchcock não tivesse sobrevalorizado o papel da Psicanálise e não o tivesse tentado transferir para o universo do Crime e do Suspense. A sequência do sonho com cenários desenhados por Salvador Dali podia ser melhor. E a aplicação de princípios freudianos na interpretação desse sonho é demasiado ingénua e artificial. De resto, com frequência, o cinema de Hitchcock convoca mais para sonhos e universos oníricos do que para retratos da vida real. E isso não é um defeito. Mas uma das suas principais qualidades.


Portanto, esperar-se-ia mais de “Casa Encantada” considerando que foi um filme muito galardoado e popular. Tem momentos de bom humor e uma interpretação relevante do actor Michael Chekhov. No que diz respeito à sua música: bem pode ter contribuído para a edificação do prestígio do filme e para a expansão da sua fama. Aqui está ela. Outrora no fabuloso écran do Cinema Tivoli em Lisboa. Hoje no sistema de som do seu computador.

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